sexta-feira, abril 19, 2024

Medidas contra o assédio

Seguindo nosso mês de conscientização sobre a saúde física e mental das mulheres, agora chegamos num assunto que mexe profundamente com os ânimos nas redes sociais: o assédio.

Para tirar nossas dúvidas, chamei as advogadas Cibele Naoum Mattos e Verônica Filipini Neves. As duas são sócias do escritório Ferreira de Mello, Neves e Vaccari, Advogados Associados.

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JornaldamodA – Qual a diferença entre assédio sexual e moral?
R: O assédio sexual caracteriza-se por constranger alguém, mediante palavras, gestos ou atos, com a finalidade de obter vantagem ou favorecimento sexual. Normalmente, o assediador aproveita da sua condição de superior hierárquico, de cargo ou posição na empresa, para intimidar e/ou chantagear a vítima. Trata-se de crime previsto no art. 216-A do Código Penal, com pena de 1 a 2 anos de detenção.
Embora também haja assédio em relação aos homens, as maiores vítimas ainda são as mulheres.
Segundo dados da OIT – Organização Internacional do Trabalho (março de 2013), 52% das mulheres que trabalham no mundo já sofreram assédio sexual no trabalho.
O assédio moral consiste na exposição de alguém ou de um grupo de pessoas, a situações humilhantes e constrangedoras, com finalidade discriminatória, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. São pequenas agressões que, tomadas isoladamente, podem ser consideradas pouco graves, mas, quando praticadas de maneira sistemática, tornam-se destrutivas.
São exemplos de ações praticadas pelo empregador, ou preposto da empresa, que podem configurar assédio moral: ameaça constante de demissão; preconceito contra trabalhadores doentes, acidentados, homossexuais ou deficientes; constrangimento e humilhação públicas; autoritarismo e intolerância de gerências e chefias; desmoralização e menosprezo de trabalhadores; etc.
No Brasil, as mulheres são o alvo mais frequente de assédio moral.
Configura assédio moral praticado contra mulheres: dificultar ou impedir que as gestantes compareçam a consultas médicas; interferir no planejamento familiar das mulheres, exigindo que não engravidem; desconsiderar recomendações médicas às gestantes na distribuição de tarefas; críticas excessivas com cunho discriminatório; perseguições psicológicas e chantagens motivadas pela rejeição e resistência da mulher aos atos que configuram assédio sexual.

JornaldamodA – Como uma mulher pode identificar que está sendo assediada no ambiente de trabalho?
R: No assédio sexual, por exemplo, em algumas situações, a vítima é seduzida pelo ofensor e, talvez por ser desinformada ou ingênua, idealiza a situação com romantismo, criando expectativa de um possível relacionamento. No entanto, este envolvimento pode se tornar uma situação complicada no trabalho, com ameaças de demissão e chantagens sexuais.
No assédio moral praticado contra as mulheres, por questões culturais (ultrapassadas) e sendo o Brasil um país considerado machista, a empregada pode não identificar o cunho discriminatório da ofensa e achar que o ofensor está no direito de criticá-la e humilhá-la perante os demais colegas.
A melhor forma de identificar uma situação de assédio, seja moral ou sexual, é por meio da informação.

JornaldamodA – Se ela identificar que está passando por isso, como reagir?
R: A vítima deve denunciar o ofensor junto à empresa, a fim de que os fatos sejam apurados e, constatada a ofensa (moral ou sexual), seja aplicada a punição cabível. Caso a empresa não dê assistência à vítima e não busque alternativas para cessar o(s) assédio(s), a vítima pode denunciar a empresa no Ministério do Trabalho e Emprego e no Ministério Público do Trabalho.

JornaldamodA – O que as empresas estão usando para diminuir casos de assédio?
R: Além das empresas buscarem meios de incentivo à denúncia dos ofensores e oferecerem meios que garantam o sigilo e preserve a identidade das vítimas, também estão investindo em treinamentos periódicos e dinâmicas em grupo, em que o gestor aborda situações cotidianas no ambiente de trabalho, que podem caracterizar assédio moral e sexual.
Também é importante que as empresas introduzam em seu Código de Ética uma política rígida de combate ao assédio, estabelecendo, inclusive, as punições aplicáveis ao ofensor.

JornaldamodA – Como as mulheres podem ajudar a outra mulher vítima do assédio na empresa? Que medidas tomar para ajudá-la ou confortá-la?
R: Vivemos em uma sociedade machista em que a mulher é discriminada em diversas situações, dentro de casa, nas relações sociais, pessoais e, inclusive, no trabalho. Muitas vezes a mulher não percebe que está sendo vítima de assédio sexual ou moral ou, ainda, atribuí a culpa pelo ocorrido a si mesma, tendo medo de denunciar o ofensor e ser reprimida na empresa e no trabalho, ou até mesmo ser dispensada.
Imagine, por exemplo, uma mulher casada que é vítima de assédio sexual. Esta mulher pode sentir medo de denunciar o ofendido e não receber o apoio do marido, com receio de que ele acredite que ela “provocou” a situação.
Da mesma forma, uma empregada solteira que é assediada por um homem casado, também pode sentir medo de denunciar o crime e ser reputada como “provocadora da situação”. Aliás, as próprias mulheres podem ser machistas e julgar a vítima do assédio como culpada.
Veja que o medo da mulher em denunciar o assediador pode ultrapassar o receio de ser dispensada do trabalho, pois a cultura machista também a persegue fora do trabalho, muitas vezes dentro da própria família e rede de amigos.
Como as mulheres podem ajudar a mulher vítima do assédio na empresa? Com solidariedade. Qual a mulher que nunca foi ofendida e discriminada por questões de gênero?
As mulheres precisam se unir e proteger umas às outras… Atos simples, corriqueiros na vida de todas as mulheres, podem ser uma forte arma na luta pela igualdade dos sexos, como por exemplo, quando uma mulher for discriminada ou ofendida, ao invés de se calarem e consentir com aquela ofensa, as mulheres presentes devem rebater o insulto, de forma não agressiva, identificando ao ofensor que aquela atitude é discriminatória e ofensiva.

JornaldamodA – Vocês acham que se as mulheres passarem a se olhar com empatia e amizade esse tipo de situação diminuiria?
R: Infelizmente, a impunidade fortalece a cultura machista. Embora o Brasil tenha avançado nos últimos anos, criando leis que visam a proteção das mulheres (Lei nº 11.340/2006), a falta de aplicação das penalidades, pelos mais variados motivos, encorajam os homens a continuar agredindo as mulheres, fazendo com que eles não reflitam sobre os seus atos.
Se as mulheres fossem unidas, assim como os homens são, e se sentissem confortáveis e seguras em denunciar os ofensores, a cultura machista perderia força, enquanto que o apoio pela igualdade entre os sexos seria fortalecido.

JornaldamodA – Por que vocês acham que aconteceu essa comoção nacional com o caso de assédio sexual envolvendo o nome do ator José Mayer? Isso aconteceria 10 anos atrás?
R: A comoção começou com as atrizes que, talvez, já foram vítimas de assédio no trabalho. Contudo, com medo de denunciar o ofensor e serem reprimidas no trabalho e socialmente, sentiram-se solidárias à autora da denúncia e orgulhosas pela coragem da vítima de se expor em rede nacional.
Com a fácil veiculação de informações pela internet e pelas redes sociais, rapidamente, o apoio das mulheres passou a ser nacional.
Acredito que esta comoção nacional e o apoio das mulheres ao combate ao assédio sexual (#mexeucomumamexeucomtodas) e de todas as formas de abusos contra as mulheres, encorajou diversas mulheres a denunciarem ofensores e a buscarem ajuda.
Certamente, este apoio nacional às mulheres não teria ocorrido há 10 anos atrás, quando as mulheres ainda eram carentes de informação, não havia muitas Delegacias de Defesa da Mulher, a Lei Maria da Penha tinha acabado de ser criada (Lei nº 11.340/2006) e não havia uma política nacional de combate aos crimes praticados contra as mulheres. Ou seja, as mulheres não se sentiam seguras em se expor.

Foto: Pixabay.

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